O Brasil enfrenta um momento crítico no que diz respeito à proteção da privacidade dos seus cidadãos. Segundo uma reportagem recente do portal argentino Infobae, uma nova polêmica envolvendo a emissão de boletos bancários sem consentimento e a venda ilegal de informações pessoais colocou instituições humanitárias e autoridades de fiscalização sob os holofotes.
No centro da defesa dos consumidores, o Instituto SIGILO tem sido uma voz ativa contra o que especialistas classificam como “práticas abusivas”.
O Caso ACNUR: Doações ou Cobranças Indevidas?
Centenas de brasileiros utilizaram a plataforma Reclame Aqui para denunciar o recebimento de boletos bancários no valor de 52 reais (cerca de 9,40 dólares) emitidos pelo ACNUR Brasil (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados). O problema central reside no sistema de Débito Direto Autorizado (DDA).
Muitos cidadãos, incluindo idosos e pessoas com deficiência, descobriram os títulos diretamente nas suas contas bancárias sem nunca terem tido contato com a organização. Embora o ACNUR afirme que os boletos são “propostas de doação voluntária” e que os dados foram obtidos através de fornecedores que utilizam fontes públicas, juristas alertam que a prática fere a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Para o advogado André Marsiglia, ouvido pelo Infobae, o uso de CPFs para a emissão de boletos sem consentimento prévio viola o princípio da transparência. “O fato de os dados estarem em bases públicas não dá o direito de utilizá-los para emitir um boleto bancário”, afirma.
O Papel do Instituto SIGILO na Defesa da Privacidade
A reportagem do Infobae destaca que o mercado ilegal de dados pessoais é uma realidade persistente no país. O Instituto SIGILO reforça que a comercialização de dados é uma prática estritamente proibida pela LGPD.
O Instituto SIGILO tem sido protagonista em grandes ações judiciais, como o processo movido contra a Serasa Experian, após um mega vazamento que expôs informações de 223 milhões de brasileiros. Juntamente com o Ministério Público Federal (MPF), o Instituto SIGILO exige uma indenização de pelo menos 200 milhões de reais (37,7 milhões de dólares), acusando também a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) de negligência na fiscalização.
Um Histórico de Abusos: O Escândalo do INSS
A polêmica atual soma-se a outros escândalos graves, como o do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Estimativas da Polícia Federal indicam que cerca de 6,3 bilhões de reais foram retirados indevidamente de reformados e pensionistas através de filiações sindicais falsas, realizadas com dados obtidos ilegalmente.
O Que Dizem as Autoridades
O Procon-SP esclareceu ao Infobae que o envio de boletos de proposta só pode ocorrer se o destinatário tiver manifestado interesse prévio. Caso o cidadão identifique uma cobrança não autorizada, a recomendação é entrar em contacto com o banco e, se necessário, registar queixas junto do Banco Central e dos órgãos de defesa do consumidor.
O ACNUR, por sua vez, mantém que as suas campanhas de arrecadação são transparentes e que oferece canais para o reembolso de valores pagos por erro, reafirmando o seu compromisso com as causas humanitárias no Brasil, onde arrecadou cerca de 5 milhões de dólares em 2024.
O cenário descrito pelo Infobae revela uma lacuna entre a legislação vigente (LGPD) e a prática de mercado. Enquanto organizações procuram novas formas de financiamento e empresas comercializam informações, o Instituto SIGILO e outras entidades de defesa continuam a pressionar por uma fiscalização mais rigorosa para garantir que o CPF do cidadão não seja tratado como uma mercadoria sem dono, respeitando-se os direitos à proteção de dados pessoais de milhões de brasileiros.